segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

C. J.

Andando desnorteado e exausto no bairro, em Tatuhy. Eu achei que era o cachorro do pedófilo do bairro, antes de saber que ele era pedófilo. Ele tinha dito que jogaria o cão na rua, pois minha mãe se recusou a pegar mais um cão. É assim, se você pega e sustenta te xingam depois, pois são muitos e latem, fazem barulho. Se não pega, explica que já tem muitos e coisa e tal, te xingam do mesmo jeito e jogam na sua cara que o animal, que nunca tem culpa, vai pra rua.
Marca de coleira no pescoço, sinal de maus tratos. Deixei no terreno, com as ratas, pra depois tentar adaptá-lo. Não gostou delas, chorava que não queria ficar lá. Onde colocá-lo? Burt já tinha batido nele, não queria mais um macho. Summer e companhia são xenófobos. Argos, Leela e Dakota? Nem pensar. Sobrou o casal 20, Frank e Pam. E pra lá ele foi. Amou Frank, brincava com ele, o seguia, foi uma folia. Frank também gostou nos primeiros dias, mas se cansou das exaustivas brincadeiras de C.J.. Meu pai o chama de formigão, pois ele realmente tem um cabeção. Eu o chamo de Cee Jay. Pra mim ele é o baixista dos Ramones. O fato é que C.J. aprendeu a pular o alambrado. Passou a visitar todos os canis. Pra minha surpresa ficou amigo do Argos, da turma da Summer e até do Burt. Ele realmente é atrapalhado, mesmo com o portão do canil aberto prefere pular o alambrado. Vai entender...

Só sei que C. J. é um cara legal, de bem com a vida. Estar perto dele me deixa feliz, me faz esquecer um pouco dos problemas e de todas as maldades que ouvimos por aí. Se eu precisasse de alguém pra vender felicidade, como faz uma certa pessoa que conheci, eu convocaria o C. J.. Só que ele faria de graça, com a maior boa vontade do mundo, só ia querer um pouco de carinho e companhia. É por isso que, apesar dos meus cães latirem até pra pipas no céu, sujarem as minhas melhores roupas e mastigarem alguns dos meus bens materiais, eu os amo tanto.

domingo, 26 de dezembro de 2010

Milk e Cheddar, os gatinhos da caixa de transporte

Acho que dá pra imaginar quem é o Cheddar e quem é o Milk, certo? Aposto que esses dois gatinhos se lembram do dia dessa foto...

Dois irmãos abandonados bem novinhos, há muitos por aí assim. Foram recolhidos, ficaram numa casa um tempinho. A pessoa ia viajar e não podia mais cuidar deles. Foram para outro lugar, uma clínica veterinária. Lá não havia espaço, assim foram colocados numa caixa de transporte. E não era das grandes, era uma daquelas pequenas de transportar gatos! Lá ficaram semanas e semanas. Morando as 24h do dia e os 7 dias da semana na caixa! A gente pode até entender, infelizmente o número de animais abandonados é grande, mas crescer numa caixa não dá...

Ficaram anunciados para adoção um bom tempo. Ninguém queria adotar os dois juntos...
 Um dia uma pessoa os levou embora, só por uns dias, pra esticarem as pernas. Era o que ela podia fazer pra ajudar. A estadia na caixa se prolongava e eles estavam ficando atrofiados... Foi o dia da foto, quando eles se viram soltos num quarto. Pra quem viva na caixa era uma imensidão! Essa pessoa tem muitos animais, não podia ficar com eles... No desespero, chegou a fazer a maldade de devolvê-los. Não dormiu aquela noite pensando nos dois. No dia seguinte foi até a clínica. Estavam na caixa, com cara de tédio, as patas pra fora da grade da porta. Quando a viram ficaram agitados, provavelmente pensavam se aquela porta se abriria novamente. Demorou, foram 137 km de viagem, mas ela se abriu :) Era uma casa grande, com vários outros gatos. Incrível como se sentiram em casa, andaram por todos os cômodos, subiram em tudo, fizeram amigos. Derrubaram metade das coisas das estantes. Cairam dentro do vaso sanitário. E se divertiram, como se divertiram...

São inseparáveis até hoje. Infelizmente ficaram com as pernas traseiras um pouco tortas, devido ao confinamento, mas nada que os impeça de continuar aproveitando cada minuto de liberdade.

E a pessoa que fez a maldade de devolvê-los pra depois buscá-los? Levou uma bronca, ouviu "mais dois?" e por aí vai, mas sabe que não se pode mudar o destino...

sábado, 25 de dezembro de 2010

Ozzy, o melhor cão do mundo

Filhotinho 100% vira-lata abandonado no meio de uma estradinha pros lados de Cotia. Estava pronto pra virar patê através de um Lada Niva...

Estava voltando de uma atividade externa do mestrado e ele lá no meio da estradinha me esperando. Veio fraquinho, entupido de vermes, chegou até a vomitar várias lombrigas, urgh. Isso e todos os filhotes que já recolhi/ajudei me deixaram com um certo problema na hora de comer macarrão espaguete... Era feinho, desengonçado, ninguém queria adotá-lo... Ozzy colecionou feiras de doação e anúncios na internet. Todos diziam que ficaria pequeno. Não ficou, cresceu muito! Conseguiu ser adotado por uma semana pelos donos de uma chácara vizinha da casa dos meus pais em Tatuí. Foi muito triste deixa-lo lá, pois ele não queria ficar. Já nessa época surgiam os meus problemas com a doação. Com o tempo eles não se resolveram, mas aumentaram e se agravaram. E muito.
Quando retornamos, uma semana depois (que mais parecia uma eternidade, diga-se de passagem), fui correndo vê-lo. Estava triste e se transformou quando nos viu. As pessoas reclamaram que ele tinha feito uns buracos no jardim. Disseram que não tinham grama no quintal e que nós tínhamos e que cães precisam mesmo é de grama. Concordei, é claro. Grama é fundamental para um cão. Com certeza! Como não percebi isso quando o doei? Nesse momento inicia-se a coleção de motivos esdrúxulos para a devolução do animal. Faço coleção disso também e adianto que foram ficando cada vez melhores!
Bom, lá fomos nós de volta com o Ozzy. Lembro-me dele rolando na grama logo que retornou, algo que sempre gostou de fazer. Acho que ele entendeu e quis mostrar que ele realmente precisava da grama, só pra voltar. Aquela noite ele dormiu comigo.
Quer saber? Agradeço a todos que não o quiseram e já digo: vocês não fazem idéia do que perderam! Um amigo de verdade, educado, protetor, fiel e que adorava abraçar! Sim, era só pedir “Ozzy, me dá um abraço?” que ele abraçava! Ah, antes que me esqueça: Ozzy vem de Ozônio. Coisas de químicos atmosféricos!

Ozzy envelheceu rapidamente. Sempre o chamamos de Ozzy Pluto por causa do osso na cabeça, sempre bem saliente. Com a idade seus músculos atrofiaram e o osso ficou ainda mais visível. Seu lado esquerdo começou a atrofiar. Começou com a pata dianteira. Não demorou muito para que não conseguisse ficar em pé. Nosso querido Ozzy estava definhando. Rapidamente. Eu tentei. Neurologista, exames, tomografia, remédios. Eu o carreguei para todo lado e nada conseguia parar aquela maldita doença degenerativa. Ozzy não mais se alimentava e chorava. Queria andar, correr e uivar com os outros cães. Não podia. Era muito sofrimento para o melhor cão do mundo. Sim, por mais que eu ame a todos, tenho que dizer: ele foi o melhor. De todos. Nunca amaremos um cão como amamos o Ozzy. Não podíamos deixá-lo sofrer. E como aconteceu várias vezes e continuaria a acontecer: mais uma vez a boa morte veio nos visitar.
Ozzy descansa no canteiro das roseiras, ao lado de sua mãe adotiva, Misha.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Homer, Bomer, Homerless

Homer morreu de velhice. Morreu velho mesmo. Viveu bastante. Comigo apenas 6 anos, já era velho quando nos encontramos. Foi um dos primeiros moradores do terreno que comprei apenas para colocar cachorros.
            Homer foi recolhido das ruas por uma veterinária. Minutos depois do ato de bondade ela começou a perceber a enorme besteira que tinha feito. Ele era feio, velho, sem graça. Adoção? Quase impossível. Homer foi parar no mesmo terreno em que Alley e muitos outros cães viviam. Local em que deixei Lisa, Lara e seus filhotes quando fiz meu primeiro resgate-família. Eu o vi num canil de quinta categoria construído com os restos dos restos. Foi amor a primeira vista. Eu me apaixonei por ele, mesmo ele sendo feio e tendo a boca um pouco torta. Coisas do coração não se explicam racionalmente...
A tal veterinária já cogitava uma eutanásia para resolver o problema que havia criado. Quando disse que ficaria com ela logo foi agradecendo ao seu deus pela graça alcançada. Eutanasiar um cão saudável não é algo que o tal deus gostaria. Antes de sair de lá Homer foi castrado e sofreu mais de 15 dias com tal procedimento cirúrgico. Essa veterinária tinha lá algumas qualidades, mas castração de machos não era o seu forte. Lógico que a culpa era sempre dos cães que eram terríveis, lambiam o saco, arrancavam os pontos e tal.
            Homer teria dificuldades em morar numa casa com quintal. Perdia muito pêlo, mas muito mesmo. Foi assim durante os 6 anos que viveu conosco. Nos primeiros anos era um macho dominante, deve ter sido um terror quando jovem. Logo que Argos, o akita, chegou colocou-o para correr. Quinze dias depois Argos se vingou e após uma luta e tanto Homer levou a pior. Tinha início a era das divisões. Cercas, alambrados e canis foram feitos para todos os lados e formaram-se várias matilhas cada uma com seu grande líder, um macho e suas fêmeas. Homer era um, Argos outro.
            Um dia, Homer, que sempre controlava muito bem a situação de sua casa-canil, escolhida por ele, estava do lado de fora, sem acesso à comida e dormindo numa casa de madeira. Não entrava mais de jeito algum naquela casa. Homer era agora Homerless. Não era mais o líder da matilha e sua casa agora era habitada por vários cães mais jovens, fortes e bonitos que ele. Coisas da Natureza, que não é boazinha. Homer nunca quis ficar na casa dos meus pais, a apenas uma quadra de distância. Lembro-me que tentamos adaptá-lo lá e na primeira oportunidade ele escapou e foi direto pro portão do terreno. Aquele era seu lar. Só que agora ele não tinha mais opção a não ser esperar a morte. Nós o levamos para a casa no outro quarteirão. Desta vez ele gostou. Sabia que não podia mais voltar pra sua casa. Escolheu uma casa de madeira num canto escondido e lá ficava dormindo quase 24h por dia. Saia para fazer suas necessidades, não muito longe claro, dava umas latidas pra parede, comia, bebia água e retornava. Meu pai falava que ele latia pra Alá, sempre no mesmo horário e pro mesmo lado. E assim Homer, ou Bomer, como meu pai o chamava, viveu seus últimos dias até que a Natureza decidisse que era o fim.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Murray e a concha para feijão

Como muitos por aí nasceu sem ser desejado. Sem nome, sem casa, sem dono. Cresceu nas ruas, perambulava de um lado pra outro em busca da comida do dia. Um dia tudo mudou... Foi atropelado por um Del Rey velho dirigido por um animal humano sem coração. Isso é que é azar... Resultado: lesão no nervo, insensibilidade na parte traseira, perda de controle de urina e fezes.


A história do Murray começou nesse momento. Sim, ironicamente sua história teve início com um atropelamento. Atropelado, foi resgatado. Resgatado, foi visto por uma "protelouca" que se apaixonou pelo seu olhar. Alguém suficientemente biruta pra colocá-lo no carro e levá-lo para casa. Essa biruta tem um pai que inventa coisas. E não é que uma concha para feijão se transformou num chinelo pro Murray? Chinelo que ele usa durante o dia pra poder andar e correr sem machucar sua pata, como se fosse um cão normal.



Essa é uma das diferenças entre os animais não humanos e a maioria dos animais humanos: eles não esperam por piedade, não se fazem de vítimas, vão em frente e continuam vivendo, superando suas limitações. Ele teve um nome, casa, donos, comida, cama, amigos cães, espaço pra andar, correr, amor e carinho. Não precisa nem dizer como ele retribuiu isso, quem conhece os cães já sabe. Quem não sabe talvez deva tentar descobrir...

Murray viveu bem, dentro das suas possibilidades, claro. Banhos regulares, quase diários, eram necessários. Ficou forte, começou a mexer o rabo, coisa que não fazia. Comeu seu chinelinho, depois de meses de uso. Neste dia nos mostrou que não mais precisava dele. Ele nos deixou muito cedo, era ainda muito jovem. Seu último mês de vida foi bem difícil. Sua pata traseira estava muito inchada, os antibióticos não faziam mais efeito e ele começou a emagrecer... O Dr. Gustavo estava tentando mantê-lo com alguns remédios, mas tudo caminhava para uma amputação. Eu não queria, pois tinha medo de ele passar por cirurgias, por causa do atropelamento e de todos os seus problemas. Sexta- feira ele estava bem, comeu as bolachinhas matinais, talos de couve no almoço, mas no final da tarde deu uma caída. Sábado de manhã não quis sair da casinha e estava tremendo. Meus pais o colocaram num quarto com panos e uma lâmpada pra se aquecer, mas ele se foi antes mesmo de eu conseguir chegar.


Murray foi enterrado ao lado da Misha, bem perto do local em que ele mais gostava de ficar - perto da porta da cozinha, onde ficava esperando meu pai sair pra segui-lo o tempo todo...

domingo, 5 de setembro de 2010

Happy Birthday Scott Bullet

Eu nunca pensei que viveria uma história como esta. Ir e voltar de Tatuí virou rotina. Passei a fazer o trajeto de 137 km entre as minhas “casas” todo fim de semana. Já nem olhava mais a paisagem, apenas dirigia. Era um sábado, fim de semana prolongado, dia 5 de setembro de 2009. Este ano foi premiado. Muitos animais, histórias, a loja virtual, um estatuto encantado que nunca era aprovado, zilhões de bernes e um CNPJ, que parecia impossível, no penúltimo dia do ano.


Mas 5 de setembro foi um dia e tanto. Lembro-me de ter passado o shopping no km 72 da rodovia Castello Branco. Não consigo precisar em que quilômetro vi o cão que eu chamaria de Scott. Estava na faixa da esquerda, no limite de velocidade. Era perto da hora do almoço. Havia muitos carros na estrada, por causa do feriado da Independência. Eu o vi, uma cabecinha amarela na valeta de escoamento de água do canteiro central da rodovia. Olhando pra mim, como se fosse nos meus olhos. Dei seta e parei um pouco a frente, já que tinha visto a cabecinha de longe. Dei ré com o carro no acostamento. Oswaldinho estava no carro comigo. Tinha medo de abrir a porta e ele escapar, mas não podia deixar de ver o que estava acontecendo. Protelouca tem que parar pra ver, não pode ir pro shopping fazer compras como as outras pessoas normais... Eu cheguei perto já munida da minha guia da sorte. Lacei muitos cães com ela, poderia laçar mais um. Nunca se tem um cambão no carro. Nunca se consegue ajuda. Quantos viram o cão? Quantos viram o meu carro parado e o cão? Ninguém ajuda. As proteloucas não correspondem a uma porcentagem expressiva da população. O cão seria disputado a tapas na recepção da clínica do Dr. Gustavo, onde as proteloucas se encontram e dividem até os lugares nos sofás, pra desespero dele. Eu cheguei perto dele, ele me olhou, estava preparada pra levar umas mordidas de um cão com dor. Foi aí que vi a fratura exposta numa pata traseira. Passei a guia em volta do pescoço e ele não esboçou reação. Não pensei duas vezes, eu o peguei no colo. Só me lembro do seu olhar triste. Eu o coloquei no banco traseiro do carro, junto com Oswaldinho. Entrei no carro e fui em frente. Não consigo me lembrar exatamente do local. Apaguei as lembranças após o resgate. Só me recordo de ter passado em Boituva antes de chegar em Tatuí. Uma das melhores coisas do ano estava lá me esperando já sabendo do cão supostamente atropelado. Não me entendam mal, disse uma das melhores coisas por ter encontrado uma pessoa com um enorme coração e extremamente determinada em fazer os mutirões de castração. Finalmente, dentre as inúmeras vezes que expliquei toda a logística dos mutirões, consegui encontrar alguém que pensasse como eu. E que estivesse disposto a “perder” seu tempo lutando pelos animais. Esta é a nossa voluntária em Boituva, Fabiana.


E aí vinha a pior parte. Chegar em Tatuí com mais um. Meus pais gostam de animais, mas existe um limite. Eu sei disso, mas os que eu poderia fazer? Deixá-lo lá? Não conseguiria. Já pensei em não mais sair de casa, mas mesmo assim eles me encontram. Gatos caem na minha cabeça. Cães amanhecem na minha porta. É um problema.


Cheguei lá, o deixei na garagem. Ele bebeu água e comeu muito. Nem precisava de carne ou algo mais apetitoso. Ração seca era suficiente. O que fazer? Os veterinários de Tatuí trabalham até as 12h. Era bem mais tarde. Apliquei uma dose de antibiótico e o deixei seguro. Segunda-feira eu o levei para São Paulo. Terça-feira estava na clínica do Dr. Gustavo. Ele e a Dra. Viviane pediram o primeiro raio-X de vários que ele faria. Além da fratura exposta existia uma fratura numa pata dianteira. E apareceram as primeiras marcas estranhas no raio-X. A veterinária do laboratório estranhou. Eram pedaços de metal. Mais tarde, quando Scott já estava internado na clínica do Dr. Pedro, mais próximo da minha casa e que o encaminharia para um ortopedista, soubemos o que eram estes pedaços de metal. Eram balas. Algo próximo a calibre 22. Ele não tinha sinais de atropelamento, o Dr. Pedro observou isso. Apenas as fraturas, nada de outros machucados. Scott tinha sido baleado e não atropelado. Como ele foi parar no canteiro central da rodovia é algo que eu nunca vou saber. Andando ele não foi. Se arrastando? Pouco provável, pois o fluxo de automóveis era enorme. Teria virado patê.

Scott foi operado alguns dias depois. Gastaram 4,5h pra tentar salvar a pata com a fratura exposta. A fratura na parte dianteira não foi operada. Não dava pra mantê-lo mais tempo na anestesia. A princípio outra cirurgia seria feita, mais tarde. Esta cirurgia nunca aconteceu e a Natureza calcificou esta fratura. Torto, mas calcificou. Após a cirurgia o aspecto da pata não era bom, os fixadores não ajudavam. Confesso que não gostei. Eu entendo que no dia da cirurgia descobriram que ele ainda tinha uma luxação coxo-femural. Ou seja, quem o maltratou deu um jeito de inutilizar ¾ das patas do animal. Era preciso tentar de tudo pra conseguir 3 patas funcionando. Tudo indicava que Scott tenha sido espancado e baleado. Teria sido usado como alvo? Divertimento? Teria sido jogado depois de toda a diversão? Eu queria saber. Queria descontar todo o mal que fizeram a esse cão. Nunca saberei quem foi e nunca vou conseguir vingança. Apenas pude jogar meia dúzia de pragas pra quem quer que tenha feito isso. Só posso garantir que ninguém mais o fará sofrer.



Scott ficou internado uns 3 meses. A conta ficou um absurdo: mais de R$3000. Ele tomava 6 comprimidos pela manhã e a mesma quantidade 12h depois. Tomou remédios para tudo: dor, infecção, estômago, etc. Foi muito bem cuidado enquanto esteve internado na clínica do Dr. Pedro. Não posso dizer outra coisa. A cirurgia é que não ficou nada boa. A calcificação não ocorria como esperado. Os fixadores foram retirados, uma tala foi feita. Mesmo assim, a cada raio-X a esperança de ver aquela pata inteira novamente ia por água abaixo. A cada raio-X de alguma outra parte também apareciam mais balas. Acredito que, das partes radiografadas, poderíamos extrair 6 balas.

Eu já estava perdendo as esperanças. Não achava que ele voltaria a andar. Embora tenha contado com a ajuda de pessoas maravilhosas, o valor do tratamento tirava meu sono. Um dia fui visitá-lo. Já não o fazia com a mesma freqüência, pois estava trabalhando muito. O Dr. Pedro o trouxe até a recepção, algo que nunca aconteceu. Scott foi colocado no chão e andou! Caiu depois de uns passos, mas andou. Ganhei o dia. Fui pra casa nas nuvens. Alguns dias depois eu o levei pra Tatuí, ficaria no canil com a tala até calcificar. Fiz filmes dele e coloquei no YouTube. Quando passou o efeito dos hormônios liberados em meu corpo pela felicidade de tê-lo visto andar novamente, mandei a notícia para os que o haviam ajudado.

Quase três semanas depois eu o levei de volta para São Paulo. A tala foi trocada. Ficar muito tempo com uma tala é ruim. Não há ventilação, em alguns pontos ela o machucava. Achei que em mais uns 15 dias estaria bom. Quando o cheiro começou a piorar eu a tirei. Havia um pequeno furo perto da articulação que vazava água com sangue. Scott estava tomando apenas antibiótico natural, pois o excesso de remédios o fez vomitar sangue. Aquele furo virou uma pequena bicheira. De um dia pro outro, você descuida e lá estão eles fazendo a festa. Limpei e retirei 14 larvas. 2009 foi o ano das larvas no calendário canino...

Uns dias depois vi uma saliência no joelho da pata operada. Apertei e ela sumiu. Logo imaginei que era o pino que estava dentro do osso. O que entendi é que este pino ficaria dançando lá dentro quando fosse o momento de sua retirada, já que sua função estaria completa, que era permitir a calcificação. Umas 3 horas depois o pino já tinha rasgado a pele do joelho e estava pra fora. E havia sangue. Eu o levei para o Dr. Milton, o único veterinário de Tatuí em quem confio. Scott foi sedado e o pino retirado. Aproveitando a anestesia pedi que ele fosse castrado. O raio-X não foi o que esperávamos. Havia uma degeneração de toda a região. Osteomielite, infecção no osso. Eu sabia que a amputação ia ser necessária. Queria acreditar que não, mas aquela pata pendurada, a água com sangue, aquilo não era bom. O Dr. Gustavo confirmou. Amputação, antes que esta infecção se espalhe e seja tarde demais. Com 3 ou 4 patas eu vou continuar amando o Scott, mas o sentimento é de derrota. Tantos cuidados, tanta ajuda com o tratamento pra manter a pata, que ele poderia vir a usar no futuro. E a solução seria arrancá-la, antes que pusesse a vida do cão em perigo. Mas eu confio muito no Drs. Gustavo e Viviane, ainda mais depois de tantos mutirões e de todos os animais que eu consultei com eles. E no meu íntimo eu sabia que isso seria necessário, não queria aceitar, mas sabia.

Scott renasceu após a amputação. O Dr. Gustavo tinha razão quando disse isso durante a cirurgia. Diferentemente dos seres humanos que esperam por piedade, Scott é feliz e não se importa.


terça-feira, 24 de agosto de 2010

Um Fiat 147, uma husky e a coxinha-isca

Misha


Sim, ela era de raça. Não sei bem se era Husky Siberiano ou Malamute do Alasca e não me importo. Na verdade parecia uma miniatura de qualquer um deles, mas muito mais peluda, uma verdadeira bola de pêlos! Estava abandonada no campus da Universidade de São Paulo (USP), parecia um BomBril... Comprei numa lanchonete uma coxinha pra ela, que me seguiu e entrou no finado Fiat 147 do meu pai. Essa cena foi vista por uma pessoa que trabalhava lá no Instituto de Química, onde eu estudava. É claro que na primeira vez que essa pessoa me encontrou logo disse que tinha visto a patética cena da coxinha-isca. Na minha opinião existem outras coisas muito mais patéticas, mas meu senso de humor não era tão desenvolvido como hoje e não lhe dei a devida resposta e não vou me ater a isso nesse momento.



É claro que tinha dono, vai saber o que aconteceu pra chegar na USP. Se eles falassem... Dizem que Huskys são fujões, sei disso, mas ela não era, mesmo tendo escapado duas vezes sempre voltou pra casa. Deve ser por que vale a pena morar aqui, risos. Sempre teve muitos problemas de saúde, acredito que era usada para procriar e quando não servia mais foi abandonada. Era uma figura, super exigente, latia/uivava e batia as patas da frente na gente quando queria alguma coisa diferente pra comer. E aí de você se não der algo diferente pra ela comer... Eventualmente precisava ser tosada, tinha muito pêlo e não nos deixa penteá-la. Um dos episódios mais engraçados foi o da sua primeira tosa completa: com medo de ela ficar triste pela tosa minha mãe a deixou ficar no sofá da sala e quando meu pai chegou perguntou o que era aquilo. Minha mãe, pra brincar, disse que tinha sido recolhida da rua e ele só conseguiu dizer “mais um?”. Naquela época recolher animais da rua não um evento corriqueiro. Mal sabia meu pai o que viria depois!



Quando comecei a escrever Misha já estava bem velha. Em 2000, quando a encontrei, já não era nova. Alguns anos depois ficou banguela, só restando os caninos e os molares. Depois seu pêlo começou a ficar feio. Ficou meio surda, embora mesmo quando escutava se fazia de surda, principalmente quando o “assunto” não lhe interessava. Sempre gostou de legumes e vegetais. De cebola a alface, passando pelos adorados jilós. Sua outra mania era dormir embaixo do gabinete da pia da cozinha.

Muitos animais são abandonados quando ficam velhos. Não é fácil ver seu companheiro envelhecer, mas o mínimo que devemos a eles, pela vida a nós dedicada, é ficar ao seu lado até o fim. Foi muito difícil vê-la definhar, emagrecer, dormir quase o dia inteiro, mas isso aconteceu. Um dia estava muito mal, já não comia mais. Não sei quanto tempo a Natureza ia demorar, então a boa morte veio nos visitar. Ela foi enterrada no canteiro das roseiras em Tatuí, local onde passou seus últimos anos.

Quando fomos enterrá-la eu agachei para colocá-la no seu local de descanso. Neste momento senti uma pata no meu ombro. Era o Murray. Ele colocou a pata e quando olhei me deu uma lambida. Acho que ele sabia o que estava acontecendo.

Dia desses recebi um vídeo por e-mail. Era de uma husky chamada Misha que uivava "I love you". Ah, não aguentei, chorei mesmo. Saudades da minha Misha...

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Missy: o filme que deu origem à série

O meu desvio de comportamento começou com uma cadelinha de aproximadamente 5 meses que perambulava pela rua da casa dos meus pais em São Paulo City. Lembro-me de ouvir minha mãe comentando que tinha dado água para um bichinho magérrimo. Tínhamos apenas duas cadelas na época, a Molly, que adotamos em 1992 e que nos deixou com 16 anos, e a Meg, poodlezinha que minha mãe ganhou e nos deixou muito cedo – vale dizer que ela não tinha rabo cortado e era LINDA!
Bom, ao ouvir esse comentário da minha mãe a primeira coisa que me ocorreu foi: se ela aparecer aqui de novo será minha! Foi um estalo. Adivinhem? Ela apareceu... Um trapinho sarnento, pele e osso, que foi batizada de Missy. Ficou linda após uma dose de Ivomec, vitaminas, alguns banhos e COMIDA, sim, o problema dela era FOME.
 
Ama bolinhas! É só falar “cadê a bolinha?” que ela fica vira a cabeça de lado, coloca as orelhas em posição de atenção e fica doida. A versão em inglês “Where is the little ball?” também dá resultado. Gosta mesmo é de bolinhas com apito, adora morder e ouvir o barulho. Também gosta de jogar as pobres bolinhas na piscina e ficar latindo, esperando que alguém as tire da água e devolva pra ela. Depois de uns gritos das bolinhas ela as joga de novo na piscina...
 
 
Missy hoje tem 11 anos. Está envelhecendo, já está com começo de catarata e suas patas traseiras estão cansadas. Ainda brinca com as bolinhas. Espero que ela ainda me faça companhia por um bom tempo :)